Direito de Família na Mídia
O romance homossexual, a morte de um dos parceiros e o impasse sobre o patrimônio
08/02/2011 Fonte: Espaço VitalA 3ª Turma do STJ, reiterando decisões pontuais anteriores, afirmou ser possível o reconhecimento da sociedade de fato entre pessoas do mesmo sexo, exigindo, para tanto, a demonstração do esforço comum para a aquisição do patrimônio a ser partilhado. Para a repartição dos bens, é necessário observar a contribuição pessoal, direta e efetiva de cada um dos integrantes da referida sociedade. O caso é oriundo do RS e envolveu um comerciante e um seu funcionário.
O julgado do STJ negou "a aplicação dos efeitos patrimoniais advindos do reconhecimento de união estável a situação jurídica dessemelhante, ainda mais que os pedidos formulados limitaram-se ao reconhecimento e dissolução de sociedade". A sociedade de fato e/ou a união ocorreu, ao longo de muitos anos, entre o proprietário de uma tradicional loja porto-alegrense e um seu funcionário. Eles moraram juntos num apartamento na Rua Duque de Caxias, em Porto Alegre.
Segundo o julgado do STJ, que deu provimento a um recurso especial do Ministério Público gaúcho e modificou decisão do TJRS, "a aplicação dos efeitos patrimoniais oriundos do reconhecimento de união estável à situação viola texto expresso de lei". O caso aguardava julgamento no STJ desde 20 de abril de 2004 e teve diversas redistribuições.
Atuam no processo os advogados Anna Maria Laydner Gaudie Ley e Francisco Rosito, em nome do autor; e Ricardo Martins Limongi, Luciane Lovato Faraco e Fabio Maciel Ferreira, em nome do espólio. (REsp nº 633.713).
Para entender o caso
* O balconista e motorista I.L.M., em 5 de março de 1996, ajuizou na comarca de Porto Alegre, "ação ordinária de reconhecimento de sociedade de fato com partilha de bens" em face do espólio de V.D., objetivando ver declarada "a existência de sociedade decorrente de união estável entre o requerente e o de cujus com o reconhecimento de seus direitos sobre a totalidade da herança".
* V.D., solteiro, sem filhos e sem ascendentes vivos, era sócio de uma empresa comercial do ramo de barbantes e linhas. Ele passou a manter encontros ocasionais e furtivos com o empregado, numa casa na praia do Imbé. Depois teriam ido morar juntos num apartamento na Rua Duque de Caxias, em Porto Alegre.
* A sentença proferida pela juíza Judith dos Santos Mottecy, então titular da 6ª Vara Cível de Porto Alegre, julgou procedente o pedido, reconhecendo a sociedade de fato havida, "para o fim de que sejam os bens de V.D. devidos ao sobrevivente, I. L.M.".
* O espólio de V.D. interpôs apelação, arguindo, preliminarmente, ser o autor carecedor de ação, ante a impossibilidade jurídica do pedido formulado decorrente da inteligência do art. 226, § 3.º, da Constituição Federal. Sustentou ainda, "não subsistir a pretensão patrimonial do autor da demanda, na medida em que não teria este contribuído para a formação do patrimônio do finado".
* A 8ª Câmara Cível do TJRS, por maioria, deu provimento ao apelo (proc. nº 599348562 ), julgando a ação improcedente. O autor da demanda interpôs recurso de embargos infringentes, a que o 4.ª Grupo de Câmaras Cíveis do TJRS acolheu em julgamento majoritário (proc. nº 70003967676).
* O Ministério Público do Estado do RS interpôs o recurso especial sustentando que "o decisum, ao definir, por analogia, a união homossexual como união estável, interpretou ampliativamente o disposto no art. 226, § 3.º, da Constituição Federal, acabando por negar vigência ao art. 1.363 do Código Civil de 1916". O recurso especial foi admitido.
* O voto do relator no STJ, ministro convocado Vasco Della Giustina - coincidentemente desembargador oriundo do TJRS - dispôs que "a situação do autor da demanda e de seu suposto companheiro falecido, quando muito, configuraria constituição de sociedade de fato, não se lhe podendo, assim, estender os efeitos decorrentes da união estável". O julgado salienta "ser evidente que, sob esta ótica, não foi a demanda apreciada pela corte de origem no tocante à comprovação de esforço comum na formação do patrimônio supostamente amealhado por ambos, impondo-se o retorno dos autos ao TJ gaúcho".
* A determinação é para que o TJ gaúcho faça "escorreita apreciação da prova, no que pertine ao esforço comum empregado pelo autor da demanda na formação do patrimônio amealhado pelo falecido". Só depois dessa análise é que a ação poderá ser julgada, definitivamente, procedente ou improcedente.
ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO
"Sociedade de fato entre pessoas do mesmo sexo, exigindo, para tanto, a demonstração do esforço comum para aquisição do patrimônio a ser partilhado"